O Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) para 2022, encaminhado pelo governo ontem ao Congresso Nacional, frustrou as expectativas de servidores(as) e contrariou a promessa do presidente Jair Bolsonaro, de conceder aumento de 5% para o funcionalismo federal no ano que vem. Na peça orçamentária (PLN 19/21), houve pouca clareza em relação à categoria.
Na proposta, estão previstas 41.716 novas vagas a serem preenchidas por concurso público e mais 13.300 para promoções e progressões. Mas, devido ao alto número de aposentadorias (em 2020, foram mais de 38 mil), ficou a dúvida se esses preenchimentos serão suficientes para manter a quantidade e a qualidade do atendimento.
O secretário especial do Tesouro e Orçamento do Ministério da Economia, Bruno Funchal, deixou claro que eventual espaço orçamentário futuro não garante a correção das remunerações.
“Não tem previsão de reajuste. O orçamento já está muito apertado. Tendo algum tipo de mudança por conta dos precatórios, vão ser definidas prioridades no orçamento. Não cabe agora a gente falar nisso”, enfatizou.
Ariosto Culau, secretário de Orçamento, contou que os concursos estão detalhados no anexo 5 do PLOA — ainda não divulgado.
“Há a necessidade de recomposição da força de trabalho pelo represamento da realização dos concursos nos últimos três anos”, admitiu Culau.
O economista Gil Castello Branco, especialista em contas públicas da Associação Contas Abertas, ironizou o documento.
“O papel aceita tudo. O governo cumpriu o prazo constitucional (31 de agosto), mas encaminhou uma proposta descasada de seus objetivos sociais e políticos. O orçamento definitivo surgirá no Congresso. E a não previsão de reajustes salariais vai ocasionar forte pressão por parte dos servidores civis, há anos sem aumento. O Congresso, em véspera de ano eleitoral, é sensível às pressões, especialmente dos servidores”, assinalou.
Rudinei Marques, presidente do Fórum Nacional das Carreiras de Estado (Fonacate), destaca que “não é possível garantir que a correção dos salários não seja feita”. O ano de 2021 é “a única janela” para tal. “Porque 2022 é ano de eleição, não se pode aumentar despesa; em 2023, o eleito pode autorizar a correção, mas para 2024. Portanto, o reajuste tem que ser dado agora, principalmente diante da insistente alta da inflação que corrói o poder de compra. Acho que Bolsonaro não vai querer ser taxado de presidente que não deu aumento em quatro anos de gestão, nesse período eleitoral”, disse Marques.
Despesa
O gasto com pessoal previsto para 2022 ficou menor que o de 2021. De acordo com os dados do Ploa 2022, o montante será de R$ 342,798 bilhões, o equivalente a 3,6% do Produto Interno Bruto (PIB). O total é inferior ao previsto na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), divulgada no início de agosto, que indicava inicialmente gasto de R$ 346,328 bilhões (3,9% do PIB). E embora o valor nominal seja superior ao do ano passado (R$ 332,355 bilhões) é menor em percentual do PIB (era 3,8%). Para os servidores, em 2022, ainda estão reservados, R$ 13,709 bilhões (0,01% do PIB) para sentenças judiciais.
O Orçamento total é de R$ 1,610 trilhão, acima dos R$ 1,485 trilhão de 2021. Dos gastos com pessoal e custeio, R$ 1,540 trilhão estarão à disposição do Poder Executivo. Para os demais Poderes, serão R$ 69,704 bilhões, sendo R$ 47,879 bilhões para o Judiciário; R$ 13,909 bilhões, para o Legislativo; R$ 7,310 para o Ministério Público da União; e R$ 606 milhões para a Defensoria Pública da União.
Salário mínimo vai a R$ 1.169
O salário mínimo será de R$ 1.169 a partir de 1º de janeiro, de acordo com o Projeto da Lei Orçamentária Anual (Ploa), encaminhado pelo governo ontem ao Congresso. Pela proposta, o piso terá uma correção de 6,27% sobre o valor atual, de R$ 1.100. A taxa, no entanto, é inferior às estimativas do mercado para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) — utilizado para corrigir o mínimo —, em torno de 8% para dezembro. Logo, é provável que, até o fim do ano, o valor precise ser novamente corrigido.
Além de não contemplar reajuste para os servidores, o projeto não prevê a ampliação do Bolsa Família, prometido pelo presidente Jair Bolsonaro. Isso porque, para respeitar as regras vigentes, os técnicos da equipe econômica colocaram integralmente os R$ 89,1 bilhões previstos para o pagamento de precatórios — dívidas judiciais transitadas em julgado — no próximo ano. Como se trata de uma despesa obrigatória, e ainda não foi encontrada uma forma de reduzir esse gasto, a projeção de pagamento foi mantida na íntegra. Isso, porém, consumiu totalmente a folga que o governo esperava ter no teto de gastos — emenda constitucional que limita o aumento das despesas à inflação do ano anterior.
No caso do salário mínimo, há um problema pela frente. Cada ponto a mais no INPC, índice usado para corrigir o piso, reduz em cerca de R$ 8 bilhões o espaço extra do teto, que estava em R$ 30,4 bilhões, pelas estimativas do Ministério da Economia. Desse modo, fica ainda mais estreita a margem para os programas que Bolsonaro pretende executar, no ano eleitoral, para recuperar a popularidade.
No PLOA, a previsão para o Bolsa Família ficou em R$ 34,7 bilhões, sem incluir, portanto, o reajuste de, pelo menos, 50% prometido pelo presidente. Em contrapartida, a proposta projeta um reforço de quase R$ 4 bilhões para a compra de vacinas.
Para ampliar o Bolsa Família nos moldes pretendidos pelo governo, a previsão orçamentária deveria ser de, no mínimo, R$ 54 bilhões para essa rubrica, estima o economista João Agostini, da Valor Investimentos.
Paralisia
De acordo com o secretário especial do Tesouro e Orçamento da Economia, Bruno Funchal, o Ploa está “enxuto”, mas não há risco de paralisação da máquina pública. “Vamos trabalhar com despesa discricionária menor e Orçamento mais enxuto, mas não existe risco de shutdown”, garantiu Funchal.
O secretário contou que R$ 105 bilhões em despesas da Previdência Social estarão condicionadas à autorização do Congresso para um crédito suplementar a ser gerado via emissão de títulos públicos. O Ploa não incluiu um centavo para as polêmicas emendas do relator-geral, que acabaram criando o orçamento secreto na LOA de 2021. A previsão das emendas individuais dos parlamentares, e as de bancada, somam R$ 16,2 bilhões.
O governo ainda prevê um deficit primário de R$ 49,6 bilhões nas contas federais no próximo ano, abaixo da meta fiscal prevista na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que permite um rombo de até R$ 170,5 bilhões (1,92% do PIB). Para Funchal, a mudança mostra impactos positivos, da evolução da receita tributária.
Analistas, porém, consideram o Orçamento de 2022 uma peça de ficção, que tem receitas superestimadas e despesas subestimadas. “O governo encaminhou uma proposta descasada em relação aos seus objetivos sociais e políticos. Com o agravamento da situação econômica, os parâmetros da proposta já estão defasados em relação às previsões do mercado”, comentou o especialista em contas públicas Gil Castello Branco, secretário-geral da Associação Contas Abertas.
“O Ploa nasceu defasado. O mais importante ficou para depois: como serão equacionados os novos gastos e as despesas com precatórios, sem ferir o teto de gastos. Ao segurar a inflação de 2021, este foi o efeito: postergar o debate mais importante. A ver”,avaliou o especialista em contas públicas Felipe Salto, diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), do Senado Federal. (Colaborou Fernanda Fernandes)
Precatórios na berlinda
A primeira reunião entre Legislativo e Judiciário para debater uma solução para os precatórios ficou marcada pelos pedidos feitos pelos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), para que haja algum tipo de parcelamento no pagamento das dívidas do governo federal reconhecidas pela Justiça. De acordo com os parlamentares, o país não pode paralisar todo o recurso discricionário do Orçamento para 2022 com o pagamento à vista dessa despesa.
Lira e Pacheco conversaram com o ministro Luiz Fux, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), instituição responsável por fazer o reconhecimento dos precatórios. Para o ano que vem, estima-se que o Executivo tenha um passivo de cerca de R$ 90 bilhões. De acordo com Lira, um parcelamento é inevitável. Caso isso não aconteça, ele alertou que o governo corre o risco de desrespeitar a regra do teto de gastos, que limita o crescimento da despesa pública à inflação do ano anterior, para garantir os recursos suficientes a todas as áreas do Executivo.