PEC 32: Relator da Reforma Administrativa confia na aprovação do texto até o final desse semestre

O governo e seus aliados dão como certa a tramitação, na Câmara, da reforma administrativa — proposta de emenda à Constituição (PEC) 32/2020. O assunto movimenta Planalto, Congresso, entidades representativas dos servidores(as) e da sociedade civil e o mercado financeiro. O embate é, principalmente, sobre os itens que podem ou não mudar e os que são inegociáveis. O relator da proposta, deputado Darci de Matos (PSD-SC), afirma que “o texto será aprovado até o fim do primeiro semestre e da forma como está”.

De acordo com ele, “a proposta é legal, constitucional e não fere cláusulas pétreas”.

“A Câmara tem mais de 350 votos pela reforma. Isso já foi mostrado na aprovação da reforma da Previdência e em outros momentos. Temos margem para a aprovação”, enfatiza.

O difícil, segundo ele, é apontar o que efetivamente passa ou não pela Casa.

“A oposição é contra e quer obstruir. Está havendo uma preocupação com a troca do estágio probatório pelo período de experiência para policiais e auditores e também com a definição das carreiras de Estado”, explica.

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara começou o debate em torno da reforma administrativa. Três audiências já ocorreram — a previsão é de que sejam sete, ao todo.

“Estamos ouvindo servidores e especialistas e formatando o relatório”, ressalta Matos.

Ele disse ter certeza de que, agora, praticamente todos os setores produtivos acreditam que a proposta vai andar.

“Antes, o mercado duvidava. Mas agora, não. É outro momento, outro cenário. O presidente da Câmara é Arthur Lira (PP-AL), aliado do governo, que já se comprometeu com as reformas administrativa e tributária”, destaca. “O ano também é bom. Todo mundo sabe que, se não fizer nada agora, não se faz mais.”

O mercado, no entanto, não demonstra tanta convicção, diante da pressão dos servidores, que vem sendo constante, coordenada e imprevisível. A economista Ana Carla Abrão — sócia da área de Finanças, Risco e Políticas Públicas da consultoria em gestão Oliver Wyman — é uma das articuladoras dos termos da proposta. Ela desconfia, inclusive, da determinação do próprio relator em não ceder aos pedidos de uma parcela significativa de eleitores.

“A mensagem principal é que, até em função do instrumento que o governo usou para fazer a reforma, que é uma PEC, corremos um enorme risco de retrocesso. A gente já ouve falar de lobbies, que querem ir justamente na direção de constitucionalizar privilégios e uma situação de desigualdades já existente dentro do serviço público e, mais ainda, entre o serviço público e o setor privado. O risco é de o Congresso e de o relator, em particular, serem sensíveis a esses movimentos”, avalia.

Segundo Ana Carla Abrão, a população precisa estar atenta, principalmente para a maneira como o assunto está sendo conduzido.

“Não se faz do dia para noite, ou em três meses. Essa é uma reforma complexa, que exige discussão, debates e a participação da sociedade e dos representantes dos servidores públicos””, frisa. “Estou realmente muito preocupada. Acredito que a pressa e essa sensibilidade em atender interesses específicos, individuais ou de alguns segmentos, em detrimento dos interesses da sociedade, podem ser mortais para a reforma administrativa.”

CONTRA-ATAQUE

Servidores(as) públicos(as) prometem mobilização total em todas as audiências para discutir a reforma administrativa. O combate ao texto ocorre em várias frentes. O Fórum Nacional das Carreiras de Estado (Fonacate) já produziu cadernos com dados científicos e estatísticas que, segundo a entidade, apontam erros e comprovam inconsistências. A Confederação Nacional dos Trabalhadores no Serviço Público (Condsef) tem um calendário de atividades para pressionar os parlamentares a barrar a PEC 32/2020.

Até as duas frentes parlamentares, supostamente adversárias, tentam encontrar pontos de convergência. “Não abrimos mão da estabilidade”, diz o deputado Professor Israel Batista (PV-DF), presidente da Frente Parlamentar Mista em Defesa do Serviço Público (Frente Servir Brasil). Já o deputado Tiago Mitraud (Novo-DF), presidente da Frente Parlamentar Mista da Reforma da Administrativa, ressalta que “estabilidade não é manto sagrado nem bala de prata”. Mas ambos exigem dados seguros do governo que comprovem a necessidade da reforma e não concordam, por exemplo, com “superpoderes ao Executivo para criar ou extinguir cargos e órgãos”.

A plataforma unificada para tentar barrar a reforma administrativa ganhou o nome de “Na pressão”. Foi divulgada no lançamento da campanha “Cancela a reforma, já”, no último dia 28. É uma ferramenta on-line para pressionar autoridades e representantes do Executivo, Legislativo ou Judiciário — que pode ser usada por servidores e sociedade civil — e uma cobrança direta a deputados e senadores para votar contra a PEC.

Vladimir Nepomuceno, assessor da Frente Parlamentar Mista do Serviço Público, entende que a pressão é fundamental.

“O governo precisa de 308 votos para aprová-la. Se conseguirmos, no limite, 307, estará resolvido o problema. No governo Fernando Henrique Cardoso, tivemos mobilização. Tentaram acabar com a estabilidade e o RJU (Regime Jurídico Único) e não conseguiram”, ressalta. “Agora, no governo Bolsonaro, na votação da PEC 186, a PEC Emergencial, conseguimos a retirada do texto da proibição da progressão de carreira. Faltaram seis votos para a base do governo. Se conseguimos quebrar isso, temos possibilidades com a proposta administrativa. É pressão na base eleitoral de cada parlamentar”, enfatiza.

Ele destaca que não adianta fazer audiências públicas virtuais — como as que estão ocorrendo na Comissão de Constituição e Justiça, com representantes do governo e da sociedade — sem manter diálogo com a população.

“Se é para cortar gastos, que é o argumento do governo, que seja no sistema financeiro, e não nos gastos sociais e nos salários dos servidores. Na Saúde, já se cortou 20% a mais do que deveria”, afirma.

Segundo Nepomuceno, o ministro da Economia, Paulo Guedes, cometeu o equívoco de comparar o gasto público com o doméstico.

“Mas o Estado brasileiro não é a casa da gente, e ele tem de produzir recursos para atender às necessidades básicas da população. Por que não se tributam aviões, helicópteros, propriedades, fortunas? Nós, assalariados, somos tributados no contracheque”, afirma.

DEBATE

Veja pontos de vista sobre a PEC

O relator, Darci de Matos, aponta motivos para a aprovação:

» A proposta é constitucional e não fere cláusulas pétreas
» O presidente da Câmara, Arthur Lira, é aliado do Planalto
» A Câmara tem mais de 350 votos pela reforma

A desconfiança de analistas

» Temem que o Congresso ceda às pressões de lobbies de servidores
» Criticam a falta de debate e a pressa em tratar do assunto

Problemas apontados por servidores

» Torna o poder público complementar ao setor privado
» Desfigura o Regime Jurídico Único (RJU)
» Amplia casos de contratação temporária
» Abre espaço para a atuação de militares da ativa em
atividades do magistério
» Concede “superpoderes” ao presidente da República na
reestruturação do Estado brasileiro

Texto: Wagner Advogados Associados

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