A cada quatro anos, a comunidade universitária da UFSM – composta por estudantes, docentes e Técnico Administrativos(as) em Educação (TAEs) – é chamada a participar da consulta pública para a escolha da nova reitoria. Em 2025, esse processo ganha destaque pela adoção do voto paritário, um avanço na democratização interna da universidade. Porém, esta decisão é apenas a ponta do iceberg na luta pela autonomia universitária da ASSUFSM.
A consulta pública é uma pesquisa realizada antes da eleição formal da reitoria, permitindo que toda a comunidade acadêmica manifeste sua preferência para reitor(a) e vice-reitor(a). Antes, os votos dos professores tinham peso de 70%, enquanto estudantes, Técnico Administrativos e Administrativas em Educação dividiam os outros 30%. Já neste ano, a adoção do voto paritário durante a consulta pública, decidida na reunião do Conselho Universitário (CONSU) no dia 11 de abril deste ano, garante a igualdade do peso dos votos entre os(as) eleitores(as).
Isso significa que cada grupo da universidade – professores, Técnico Administrativos e Administrativas em Educação e estudantes – tem o mesmo peso na decisão sobre o resultado da consulta para eleição da reitoria. Ou seja, mesmo que a quantidade de votos de cada segmento seja muito diferente, para calcular o resultado das eleições, soma-se o percentual de cada grupo e divide-se por três, o que garante a valorização igualitária dos votos de todos os grupos.
Apesar dessa evolução para a democracia e autonomia universitária, o voto paritário é apenas um pequeno passo permitido pela legislação brasileira, uma vez que a palavra final para a decisão da eleição continua nas mãos do Governo Federal, segundo a Lei nº 9.192, instituída em 1995.
A lei, que estabelece a formação de uma lista tríplice para a escolha de reitores(as) nas universidades públicas, está em vigor desde 1995, no governo de Fernando Henrique Cardoso, do PSDB. Essa norma mantém um modelo herdado da ditadura militar, quando o governo centralizou o controle sobre as universidades. Com ela, o presidente da República pode escolher um dos três nomes indicados pela comunidade acadêmica, mas não necessariamente o candidato ou a candidata mais votada na consulta pública.
Dessa maneira, a legislação dá espaço para intervenções políticas por parte do poder federal, assim como ocorreu nas eleições de 2020 na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) durante o mandato do ex-presidente Jair Bolsonaro. Para Natália San Martin, Conselheira Universitária e Coordenadora Geral da ASSUFSM, este tipo de intervenção atinge diretamente a democracia e autonomia internas das universidades. O ideal, segundo Natália, seria que a escolha da Reitoria acontecesse de forma totalmente interna, paritária e democrática. Assim, caberia à universidade apenas comunicar o resultado ao Governo Federal, sem interferências externas e fortalecendo a autonomia e a democracia universitária.
Outro obstáculo para a execução de uma eleição completamente paritária na UFSM é a composição dos Conselhos Superiores, onde os membros são formados 70% por docentes e 30% de outros segmentos da comunidade universitária. Para Guilherme Elwanger, Conselheiro Universitário e Coordenador Financeiro e Patrimonial da ASSUFSM, apesar do peso do voto paritário ser uma grande conquista, esse entrave está estabelecido no Estatuto e no Regimento Interno da UFSM e atrasa a realização de uma eleição efetivamente democrática.
A (falta da) presença de TAEs na reitoria
Além da influência política nas nomeações, outro ponto que levanta críticas é a exclusão dos Técnico Administrativos e Administrativas em Educação das candidaturas à Reitoria. Pela legislação atual, apenas docentes podem concorrer ao cargo de reitor(a) nas Universidades Federais. Isso significa que, mesmo sendo parte fundamental da universidade e representando um número expressivamente maior em comparação com docentes dentro da comunidade acadêmica em Santa Maria, TAEs não têm o direito de se candidatar.
Porém, nem sempre aconteceu dessa forma. Edmilson Lima, atual prefeito no órgão auxiliar de gestão da Universidade de Brasília (UnB), foi candidato à reitoria da UnB durante as eleições para reitor(a) e vice-reitor(a) em 1993, quando ocupava o cargo de vigilante na universidade. Sua experiência fez parte da terceira eleição da universidade quando ainda tinha 32 anos e ainda não possuía Ensino Superior. Segundo Lima, a eleição fez parte de um contexto muito democrático onde foi aberto espaço para discussões acerca dos propósitos sociais das universidades federais.
De acordo com informações do site Gov.br , a lei que restringe a candidatura à reitoria exclusivamente para docentes entrou em vigor em 1996, impedindo a participação de Técnico Administrativos e Administrativas em Educação no processo eleitoral. Para Lima, essa mudança se deu em decorrência de uma crença ideológica e precipitada do governo de Fernando Henrique Cardoso de que os espaços de decisão devem estar nas mãos daqueles que detém Ensino Superior, o que acaba contribuindo para a elitização das universidades federais.
“Apesar de atualmente os TAEs terem totais condições de obterem mestrado e doutorado, um dos objetivos da universidade federal deve ser o acesso e o atendimento à classe trabalhadora e essa decisão, tomada em 1996 e ainda vigente, contribui para tornar as universidades mais elitizadas, pois afasta outros segmentos da comunidade acadêmica dos espaços de decisão”, ele relata.
Apesar de não ser mais permitida a candidatura de TAEs para a Reitoria das universidades, é possível que eles ocupem alguns espaços dentro das Pró-Reitorias, como é o caso da Pró-Reitoria de Gestão de Pessoas da UFSM, com o atual Pró-Reitor Frank Casado. Para Natália San Martin, este tipo de exceção contribui para a mudança do cenário atual e excludente, mas ainda é algo muito inicial e, na prática, essa iniciativa avança a passos lentos.
“O que poderia tornar diferente essa realidade seria a adoção de eleições nos Centros ou Setores Administrativos para os cargos da Pró-Reitoria, onde seria possível oportunizar um espaço de decisão maior aos Técnico Administrativos e Administrativas em Educação da UFSM”, avalia a coordenadora geral da Assufsm.
Quais serão os próximos passos
Após a decisão pelo voto paritário nas eleições para a Reitoria da UFSM em 2025, o período para inscrição das chapas será de 21 de maio a 24 de junho. Encerrado esse prazo, a consulta pública será realizada no dia 25 de junho, das 7h às 22h, já com a aplicação do peso paritário entre os votos dos segmentos da comunidade universitária. O resultado da pesquisa será divulgado no mesmo dia, às 22h30min. Até o momento da produção desta reportagem ainda não há informações de como será realizada a consulta pública com a comunidade universitária.
Tendo em vista todos os processos a serem seguidos para a eleição da Reitoria na UFSM, o processo eleitoral possui três etapas:
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Execução da Consulta Pública junto à comunidade acadêmica, que será realizada no dia 25 junho;
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Eleição nos Conselhos Superiores da instituição (Conselho Universitário, Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão e Conselho de Curadores);
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Envio da lista tríplice votada nos conselhos para nomeação pelo Ministério da Educação.
A luta por direitos e pela ampliação da representatividade nas instâncias universitárias é uma bandeira histórica da ASSUFSM, como destaca Eloiz Cristino, Técnico Administrativo em Educação aposentado.
“Nós, de entidades como o Diretório Central de Estudantes e a ASSUFSM, não queremos ser vistos como ‘pedra no sapato’ da gestão, queremos ter oportunidade de sermos ouvidos dentro da universidade e participar de decisões que são fundamentais e impactam diretamente nossa realidade, afirma Eloiz.
A participação de todos os grupos na Consulta Pública é fundamental para fortalecer a democracia interna da UFSM e garantir que as decisões da universidade atendam aos interesses coletivos de estudantes, Técnico Administrativos e Administrativas em Educação e docentes de forma a atingir positivamente às demandas da comunidade trabalhadora de Santa Maria e região.
TAE, participe das decisões da comunidade acadêmica!