Teletrabalho e PGD: esclareça dúvidas sobre a temática no âmbito jurídico e político

O Teletrabalho nas instituições públicas já começou a ser debatido dentro da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), pela Comissão Temporária de Avaliação e Implementação do Teletrabalho. O Decreto 11.072 foi publicado no dia 18 de maio de 2022, no Diário Oficial da União, é conhecido por Programa de Gestão e Desempenho (PGD) e traz inúmeros problemas para o e a servidora pública. A Comunicação da Assufsm realizou entrevistas com o Advogado Heverton Padilha, da Wagner Advogados Associados, com a Coordenadora Geral da Assufsm, Loiva Chasis e com o Coordenador de Formação Política e Sindical, Eloiz Cristino para entender melhor sobre as problemáticas do Teletrabalho.

Você pode acompanhar a entrevista completa, abaixo:

Comunicação: Juridicamente falando, o que é o Teletrabalho e quais as principais diferenças desta modalidade para o trabalho remoto ou home office, vivido durante a pandemia?

Heverton: O Teletrabalho é uma das modalidades doPrograma de Gestão e Desempenho (PGD) prevista do Decreto 11.072 de 2022, que dispõe sobre o cumprimento de jornada de trabalho no serviço público, seja na modalidade presencial ou no Teletrabalho. Esse PGD é um instrumento de gestão que regula as atividades dos e das participantes, com foco na entrega de resultados e na qualidade do serviço prestado à sociedade. O ou a optante pelo regime não tem direito adquirido a esse tipo de trabalho, tanto que pode ser revisto pelo próprio trabalhador ou trabalhadora, ou pela gestão.

Outro aspecto importante é a diferença entre o Teletrabalho e o trabalho remoto: o trabalho remoto, que foi uma medida de urgência sanitária, foi imposto, devido a situação de pandemia, para que os trabalhadores e trabalhadoras fossem direcionadas ao home office sem consequências ao seu regime de trabalho. Já o Teletrabalho, que possui uma regulamentação específica, depende de critérios de interesse e possibilidades da gestão, da natureza da função, do e da trabalhadora, que passa a trabalhar a partir de metas, sem o uso do ponto eletrônico.

O PGD, que não é exatamente o Teletrabalho, em razão de existir também na modalidade presencial, faz com que o e a agente pública cumpram suas metas no ambiente de trabalho. Diferentemente do Teletrabalho, no qual o funcionalismo público cumpre suas metas de forma remota. O Teletrabalho pode ser parcial ou integral, vinculado ao interesse da administração.

Comunicação: Os instrumentos do Teletrabalho serão fornecidos pelo empregador? Como ficam as despesas laborais nessa modalidade?

Heverton: Existem questões como o acordo mútuo de obrigações entre o e a trabalhadora e a chefia, a compatibilidade das atividades desenvolvidas com o regime de Teletrabalho e a ausência de prejuízo à administração pública, o que significa que o fornecimento e custeio da estrutura física e tecnológica para o trabalho será sob a responsabilidade do e da agente pública. Assim, existe até mesmo um critério que exige a existência de um número de telefone para livre divulgação externa, por responsabilidade do e da trabalhadora e também a ausência de aumento de despesas para a administração pública.

Então, é importante destacar que a responsabilidade de manter a infraestrutura do Teletrabalho é integralmente dos servidores e servidoras públicas, além de que a segurança no manejo dos dados, como os antivírus, softwares adequados, internet segura, também é de obrigação dos e das trabalhadoras.

Existe uma grande questão em relação a segurança física no trabalho, que diz respeito a cadeiras adequadas, mesas proporcionais, que é o risco ergonômico e os acidentes de trabalho. Há uma dificuldade imensa em comprovar que os acidentes ocorreram durante o período de trabalho nesse regime.

Comunicação: Pagamento de horas extras, adicionais de insalubridade e subsídio de alimentação ficam garantidos com o Teletrabalho?

Heverton: No Teletrabalho, existe uma grande preocupação quanto aos prejuízos financeiros, devido a retirada de alguns direitos. Por exemplo, caso o ou a servidora seja convocada a ir até o ambiente de trabalho, a locomoção não será coberta pela administração, mesmo que seja intermunicipal ou até interestadual. Outra questão é o adicional noturno, que também não é pago a quem adere ao Teletrabalho, adicionais de periculosidade, como raio X e radiação ionizante também não são pagos, o que pode trazer prejuízos até mesmo na aposentadoria.

As horas extras tampouco serão autorizadas e devidas ao trabalhador e a trabalhadora, assim como o auxílio moradia e alimentação. Tudo isso mostra o quanto esses fatores devem ser avaliados no momento da adesão do regime.

Comunicação: Ao passo em que a tecnologia traz mais comodidade, pode trazer também uma sobrecarga de estímulos e de demandas. No Teletrabalho, o trabalhador(a) corre o risco de ter de estar “disponível o tempo todo”?

Eloiz: Os e as trabalhadoras que aderirem ao PGD poderão estar exercendo seu trabalho fora de sua lotação, em seus domicílios ou onde quiserem e terão que apresentar metas às chefias de acordo com aquilo que foi pactuado. O risco de estar disponível o tempo todo pode acontecer, mas existe uma jornada de trabalho a ser cumprida através das metas. Então esse é mais um problema de reflexão que poderá levar ao descontrole desse tempo disponível por cada trabalhador e trabalhadora no Teletrabalho. Esse também é um fator a ser pensado antes de aderir ao Teletrabalho.

Comunicação: Quais os impactos do Teletrabalho na carga mental, visto que fica cada vez mais difícil, especialmente para as mulheres, a separação necessária entre a atividade laboral e a vida doméstica?

Loiva: O impacto do Teletrabalho na saúde mental muitas vezes não é sentido de imediato e muitas vezes as pressões da entrega de metas e o isolamento são sentidos no futuro. Esse acúmulo de precisar conciliar trabalho com tarefas da casa, principalmente para as mulheres, que sentem uma pressão maior em atender os filhos(as) e a família, tende, muito possivelmente, a levar a uma recaída e uma repercussão muito grande na saúde mental das trabalhadoras.

Comunicação: Quais os impactos do Teletrabalho para as relações de trabalho?

Eloiz: As relaçõesno Teletrabalho serão autocráticas, verticalizadas entre a chefia imediata e quem aderiu o regime. Elas fogem da relação entre a equipe, haverá um certo isolamento social, no qual a chefia só avalia as metas apresentadas. Enquanto isso, para nós a avaliação deve ser da gestão democrática, da equipe e de todo o compromisso da gestão coletiva e da organização do setor, então existe uma preocupação muito grande com as relações de trabalho. Esse PGD pode levar a algo que tememos e nos preocupamos muito, que são os casos de assédio moral, isso é um grande alerta e uma reflexão a se fazer.

Comunicação: Quais os principais prejuízos em relação ao plano de carreira, o chamado PPCTAE?

Loiva: A nossa lei, o PCCTAE (Plano de Carreira dos Cargos Técnico Administrativos(as) em Educação), tem todo um planejamento e organização do trabalho de forma conjunta e coletiva, enquanto o PGD é muito verticalizado, com uma relação de chefia e servidor(a) e não o conjunto da equipe como foi pensado o PCCTAE. Desde o processo de quem constitui as atividades e como planeja não é pensado no PGD, no qual a chefia encaminha as atividades e o trabalhador e a trabalhadora vão ter que entregar em metas a partir de uma avaliação de superiores.

Comunicação: Quais são os critérios de mensuração do trabalho estabelecidos pela Instrução Normativa para dizer se o servidor se enquadrar nessa modalidade ou não?

Loiva: A questão de metas ainda não foi regulamentada e tampouco a natureza das atividades a serem realizadas. Por enquanto isso é pactuado pela chefia imediata com os e as trabalhadoras. No momento que a questão for regulamentada, em forma de termo de responsabilidade, terão que ser estabelecidas a relação de chefe e funcionário(a), as talas de pontuação e os resultados.

Comunicação: Como fica o controle das jornadas de trabalho e a avaliação de desempenho do funcionário público?

Loiva: O controle de assiduidade e de frequência no PGD não será mais pelo ponto eletrônico, e sim por resultados e metas pactuados pelo e pela servidora. Em relação a avaliação de desempenho provavelmente terá uma relação direta com a frequência e as entregas/metas, já que é feita pela chefia e por quem exerce o cargo, apesar de isso ainda não ter sido estabelecido normativamente pelo plano.

Comunicação: Por que o decreto fere a autonomia das universidades?

Eloiz: O decreto fere a autonomia universitária,em primeiro lugar, porque vem de um Ministro de Estado que regulamenta e autoriza essa questão. Para nós é fundamental a avaliação da gestão democrática, da organização de cada instituição federal de ensino, do seu plano de gestão, da avaliação de desempenho das equipes, do seu plano de desenvolvimento institucional e principalmente dos integrantes da carreira.

Comunicação: Por que essa modalidade de trabalho tem ganhado tanta força nos últimos meses? Quais são os reais desejos do Governo com esse decreto dentro da administração pública?

Loiva: Quanto aos servidores e servidoras atraídas a aderir o PGD, é importante dizer que estamos vivenciando uma grande crise de falta de salários e um aumento de tudo, em especial a gasolina, o que acaba dando uma falsa impressão aos e às trabalhadoras de que o Teletrabalho pode terminar com isso, a partir da economia com a locomoção e o tempo. Isso até pode acarretar em uma economia em termos de gasolina, mas é importante que as pessoas pensem que ao economizar uma determinada questão financeira, é possível que terão que gastar com outras, como internet, luz, telefone e estrutura de trabalho em casa. Então aquilo que aparentemente pode favorecer, futuramente pode acarretar em um gasto maior no que diz respeito às condições de infraestrutura para exercer as atividades no Teletrabalho. O governo quer economia e o Teletrabalho proporciona isso, já que ter os servidores e servidoras em suas casas tomando conta de todas as condições para trabalhar gera uma grande economia para o Estado. Assim, o grande perigo que está pela frente é o desmonte da universidade pública com o esvaziamento dos espaços públicos e a consequente perda de território.

Por fim, o Setor de Comunicação da Assufsm já preparou um Boletim Informativo Especial e uma Live Extraordinária no Facebook sobre o Teletrabalho e PGD.

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